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sábado, 12 de maio de 2012

Computadores: invertendo as coisas com Biotecnologia



Pesquisadores da Universidade de Leeds, no Reino Unido, podem ter descoberto o caminho para possibilitar a construção de computadores no futuro.
ResearchBlogging.org
Atualmente todos os componentes eletrônicos de um computador são feitos em sistema top-down, ou seja, “pedaços” maiores de material (geralmente metais condutores ou cristais semicondutores) são cortados, moldados e manipulados até se conseguir os circuitos, que hoje em dia se encontram na escala de micro, ou seja, um milhão de vezes menor que o metro. Só que a tecnologia utilizada nesse tipo de processo um dia chegará numa fase de estagnação, pois circuitos em escalas menores (como o nano, um bilhão de vezes menor que o metro) não são possíveis de se produzir em sistema top-down. Segundo a pesquisadora que conduziu os estudos, “estamos rapidamente alcançando os limites da manufaturação eletrônica tradicional conforme os componentes de computador ficam menores. As máquinas que tradicionalmente usamos para fabricá-los são desajeitadas em escalas tão pequenas. A natureza nos dá a ferramenta perfeita para contornar esse problema”.

E qual é essa ferramenta? O método utilizado nesse caso foi a utilização de cristais de magnetita produzidos de maneira análoga ao que ocorre dentro de uma bactéria magnetotática. Seria uma espécie de sistema bottom-up onde o cristal literalmente “cresceria” ou se “formaria” onde você quisesse que ele se formasse, o que pode ser utilizado para uma infinidade de coisas, inclusive construção de componentes eletrônicos
Bactérias magnetotáticas são microorganismos aquáticos geralmente anaeróbios que utilizam um sistema magnético para sua localização espacial. Não chega a ser um GPS, elas apenas utilizam cristais de magnetita (um cristal composto de Ferro e Oxigênio) que são naturalmente magnéticos para se alinharem ao campo magnético terrestre e assim se localizarem nos pontos onde a concentração de oxigênio e nutrientes às agrada. E elas literalmente produzem esses cristais, fazendo eles crescerem dentro delas, com a ajuda de uma maquinaria enzimática própria.

O que os pesquisadores fizeram foi utilizar essa mesma maquinaria para fazer crescer magnetita onde eles quisessem (no caso, eles produziram um padrão quadriculado). Eles imobilizaram a enzima que “produzia” os cristais numa superfície produzindo esse padrão quadriculado e depois adicionaram uma solução onde havia Ferro e Oxigênio, e a enzima fez todo o trabalho duro.

O resultado final é esse da figura do artigo. Em cima dá pra ver bem o padrão formado e em baixo é um zoom dos cristais formados.



Além disso, o mesmo grupo está desenvolvendo métodos de fabricação de nanotúbulos contendo metais inseridos (como Ouro e Cobre), o que poderia ser utilizado como um nanofio para conduzir energia elétrica. Da mesma maneira como acima, seria um sistema bottom-up utilizando enzimas, ou seja, é um processo biotecnológico.

Abaixo dá pra ver bem o nanotubo formado, os pontinhos mais escuros são os metais (na figura a são Cádmio, e Zinco e na figura b é Ouro).




Graças à biotecnologia, seu computador não vai mais ficar obsoleto! Tá pronto pra comprar seu iBio?

Por Luiza Montenegro Mendonça.
Todas as figuras foram retiradas dos artigos abaixo ou da página da Universidade de Leeds.



Galloway, J., Bramble, J., Rawlings, A., Burnell, G., Evans, S., & Staniland, S. (2012). Biotemplated Magnetic Nanoparticle Arrays Small, 8 (2), 204-208 DOI: 10.1002/smll.201101627


Tanaka, M., Critchley, K., Matsunaga, T., Evans, S., & Staniland, S. (2012). Fabrication of Lipid Tubules with Embedded Quantum Dots by Membrane Tubulation Protein Small DOI: 10.1002/smll.201102446

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Combatendo a crise do petróleo com ideias mirabolantes...


Mas se o post é sobre crise de petróleo, porque raios tem uma foto de algas marinhas?

ResearchBlogging.org
O petróleo vai acabar um dia. É um fato. As reservas de petróleo demoram milhares de anos para se formar, e nós humanos somos capazes de consumir um poço de petróleo inteiro em poucas dezenas de anos. E nem adianta, não há pré-sal que dê conta dessa matemática. Um dia vai acabar, ponto final. Essa questão não é nem um pouco nova, pelo contrário, ela existe desde pelo menos 1956, quando o fechamento do Canal de Suez pelo Egito deu início à primeira crise do petróleo. O mundo deu-se conta de que as reservas eram, sim, finitas, e pior, estavam muito mal distribuídas pelo globo...

Aos poucos (e enfatizem o aos poucos) o mundo passou a pensar e procurar novas fontes de combustíveis que fossem renováveis, ao contrário dos poços de petróleo. O Brasil teve (e tem) um papel pioneiro, lançando o programa pró-álcool em 1975, dois anos após a segunda crise do petróleo, em 1973, que consistia em produzir bioetanol a partir de cana-de-açúcar. Os EUA tentaram imitar (uns trinta anos mais tarde), produzindo bioetanol a partir de milho (uma tremenda furada, já que o rendimento é baixíssimo comparado com o processo brasileiro). Várias outras fontes de biocombustíveis foram e vêm sendo testadas, mas todas têm um problema em comum: elas competem com os alimentos. A cana por exemplo. Já estamos mais do que acostumados em ouvir que o açúcar ficou mais caro por conta da demanda por álcool combustível, ou vice-versa. E quando a fonte não é comestível, há a questão da competição por terras. Ou seja, hectares que forem ser usados para plantio de mamona (que não é comestível, por exemplo), para gerar biocombustíveis, poderiam estar sendo usados para plantar comida, oras! E acreditem, terras cultiváveis serão disputadíssimas num futuro (infelizmente) não muito distante.

Mas um estudo que ganhou a capa da Science no mês passado pode mudar esse horizonte sombrio. Os pesquisadores, que trabalham numa empresa de biotecnologia da Califórnia, usaram uma Escherichia coli geneticamente modificada para transformar algas marinhas em bioetanol. A E. coli é sem dúvida a bactéria mais estudada do mundo, e está pertinho de você. Na verdade, dentro de você. Ela naturalmente habita o cólon de animais de sangue quente, e é frágil, quase não sobrevive fora do organismo de alguém (por isso ela é usada como indicador de poluição recente, pois se você encontrar E. coli em algum ambiente é porque houve algum tipo de contaminação tão recente que a E. coli ainda nem morreu).

A E. coli é capaz de fermentar alguns carboidratos (açúcares), ajudando na sua digestão (e também faz vitamina K de graça pra você, que é incapaz de sintetizá-la). Mas a E. coli não consegue degradar algas marinhas. As algas são compostas de três tipos de açúcar: alginato, manitol e glucana. Naturalmente, a E. coli é capaz de degradar o manitol e a glucana, mas não o alginato. O alginato é um carboidrato composto de repetições lineares de dois açúcares individuais, como uma “correntinha” enorme feita de dois “elos” diferentes. O que os pesquisadores fizeram foi inserir os genes responsáveis pela degradação do alginato na E. coli, mas não apenas isso. Eles transformaram a bactéria numa plataforma completa de degradação de alginato. Eles inseriram na E.coli mais de 20 genes de diferentes origens: Vibrio splendidus, uma bactéria marinha capaz de degradar algas, Pseudoalteromonas, outra bactéria marinha que também coloniza algas, e Zymomonas mobilis, uma bactéria capaz de produzir etanol em altos níveis. Esses genes foram capazes de degradar o alginato de uma “correntinha” de açúcar para apenas alguns “elos”, transportar essas pequenas cadeias para dentro da bactéria, separar os elos até açúcares individuais, transformá-los em intermediários, até que pudessem ser aproveitados pelas próprias vias da E. coli produzindo por fim uma molécula que poderia ser transformada em etanol (através dos genes da Zymomonas).
Representação esquemática das vias de degradação de alginato "implantadas" na E. coli 

No total, aproximadamente 40 Kilobases foram inseridos na pobre E. coli. O genoma da E. coli tem apenas 1 cromossomo circular de pouco mais de 4 Megabase, ou seja, quatro milhões de pares de bases nitrogenadas (aquelas letrinhas A, T, C, G, que codificam o DNA). Eles adicionaram 40.000 pares de bases, o que corresponde a 1% do genoma da bactéria! Acredite em mim, isso é muita coisa! Num laboratório comum, não se consegue nem mesmo colocar mais do que 20 Kilobases DENTRO da bactéria. Imagine colocar tudo isso integrado dentro do GENOMA dela! Essa E. coli deve ter batido o recorde de organismo mais geneticamente modificado.

Depois dessa manipulação toda, eles finalmente testaram a capacidade da bactéria de degradar a alga e produzir etanol. Eles adicionaram alga pulverizada (uma farofa de alga praticamente) na cultura de E. coli e monitoraram o consumo de açúcares e a produção de etanol. Os resultados foram bem positivos. Conseguiu-se 0,281 gramas de etanol para cada grama de alga seca utilizada, o que corresponde a 80% do rendimento teórico, ou seja, a bactéria transformou 80% dos açúcares da alga em etanol (até porque, a alga não é feita só de açúcar). E sabe qual a melhor parte? Já existem "fazendas" de algas, mas você não precisa de terras pra cultivar algas! E com quase 70% do globo coberto por mares, estamos longe de ter uma disputa por "mares cultiváveis".

"Fazenda" de algas marinhas na China

Os próximos passos agora devem ser escalonar o processo, pra crescer a bactéria em grandes volumes, podendo assim, usar muita alga e conseguir muito etanol, já que todos os testes foram feitos em escala de laboratório. E num futuro talvez não tão distante você poderá abastecer seu carro com bioetanol feito de algas. Pode falar, você já pode ter pensado em muitas alternativas pra solucionar a crise da falta de petróleo, mas aposto que NUNCA imaginou que a solução pudesse envolver algas e bactérias!

Por isso esse estudo é um bom exemplo de muitas coisas: um bom exemplo de contribuição da ciência à uma necessidade global, um bom exemplo de que organismos geneticamente modificados não se limitam às sementes da Monsanto, um bom exemplo de que organismos geneticamente modificados não são necessariamente ruins, e um bom exemplo de que coisas loucas e não convencionais podem dar certo.

Mensagem pra levar pra casa: Não limite seu pensamento!

Por Luiza Montenegro Mendonça.

Figuras retiradas daqui.
É muito estranho escrever ideia sem acento...

Wargacki, A., Leonard, E., Win, M., Regitsky, D., Santos, C., Kim, P., Cooper, S., Raisner, R., Herman, A., Sivitz, A., Lakshmanaswamy, A., Kashiyama, Y., Baker, D., & Yoshikuni, Y. (2012). An Engineered Microbial Platform for Direct Biofuel Production from Brown Macroalgae Science, 335 (6066), 308-313 DOI: 10.1126/science.1214547
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