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sábado, 31 de dezembro de 2011

Agradecimentos e Desejos


O blog é novo, foi “inaugurado” no dia 29 de Dezembro à 19hs, não tem nem 50hs de vida, mas isso não é desculpa pra eu não desejar Feliz Ano Novo, certo?

Além do mais, o blog têm muito o que agradecer a vocês, leitores! A figura dá uma idéia do porquê, apesar dos números pequenininhos, acho que dá pra ler, senão, eu te digo o que é! Nem 50hs de vida e já são 184 visitas, espalhadas por 7 países diferentes (só não me perguntem como!). Sinceramente, eu não entendo de nada de acesso e número médio de visitas, mas pra mim, 184 é visita pra caramba à beça! Aliás, tenho um novo hobby, ficar atualizando a parte das estatísticas do blog e ver o número crescendo!

Então é isso, espero que 2012 seja um ano muito produtivo e feliz pra todos nós. Que possamos conquistar todos os nossos objetivos (ou a maioria deles, vai...), ganhar muita grana (sempre muito importante!), rir até a barriga ficar doendo, não fazer nada quando não quisermos fazer nada e nos surpreendermos com coisinhas simples e bobocas, mas que colocam um sorriso no nosso rosto... Se eu puder pedir um pouquinho mais, desejo que o blog cresça e que dê certo (pelo visto, se depender de vocês, vai!).

Feliz 2012! E Muito Obrigada!


Por Luiza Montenegro Mendonça

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

O primeiro caso de censura da ciência moderna



Lembram-se que eu disse (no post anterior, olha aqui) que havia um episódio que estava tirando o sono da comunidade científica?

Pois bem, dia 20 de Dezembro uma história que vinha se desenrolando há quase dois meses chegou ao seu desfecho.

Cientistas dos Países Baixos (sabiam que a Holanda é só uma das províncias dos Países Baixos?) realizaram um experimento longo e demorado, porém simples, em furões. Eles estudavam o vírus influenza subtipo H5N1. O furão é um bom modelo para se estudar a infecção por influenza, porque eles apresentam sintomas e reações semelhantes à que nós humanos temos quando estamos gripados, além de serem fofinhos. O experimento consistia em infectar um ou mais furões e deixar o vírus fazendo a festa replicando livremente, recolher os novos vírus produzidos e passando de um furão a outro durante um longo período de tempo até notarem que o vírus repentinamente tinha se tornado mais transmissível que antes (um sinal de que algo havia mudado no vírus original). Em virologia isso se chama treinamento viral, e é feito justamente quando se deseja identificar quais mutações genéticas conferem a um determinado vírus uma nova característica. Nesse caso o treinamento foi feito a fim de descobrir quais mutações tornavam o vírus transmissível pelo ar (e não através de contato íntimo, como o que ocorria antes). Quando eles analisaram o vírus resultante e comparam com o vírus original, eles notaram que houve (apenas) cinco mutações em dois genes virais, e que essas mutações eram responsáveis pela nova característica desse vírus, a transmissão aérea.

Esses resultados podem ter desdobramentos muito favoráveis. Podemos monitorar o H5N1 circulante na natureza e acompanhar em que estágio de mutação ele se encontra, possibilitando uma ação preventiva ANTES que o vírus se torne plenamente transmissível pelo ar. Podemos desenvolver drogas, kits diagnósticos e talvez até vacinas para esses vírus, se fosse necessário.

O H5N1 geralmente infecta aves com uma alta letalidade (aproximadamente 50%), e há casos de infecção em humanos que tiveram contato com aves (poucos, porém também com alta letalidade). No entanto esse vírus não consegue se transmitir bem de humano a humano.

E aí está tudo o que é necessário para um alarmismo (infundado). A NSABB (National Science Advisory Board for Biosecurity ou Conselho Consultivo Científico de Biossegurança dos EUA) solicitou que o artigo não fosse publicado em seu estado atual, e que o mesmo fosse reescrito, omitindo dados (incluindo a sequência genética do vírus mutado), a fim de não se tornar uma receita para o bioterrorismo. Afinal, tínhamos um vírus altamente letal (H5N1) que era agora capaz de transmitir por via aérea! Se essa informação caísse em mãos erradas, poderíamos ter a maior pandemia de influenza da história! Exemplos de matérias apocalípticas sobre esse episódio podem ser vistos aqui e aqui.

Agora, vamos aos fatos (afinal, esclarecer e informar cientificamente o público foram justamente alguns dos motivos que me levaram a criar esse blog).

Sabemos que o H5N1 original (ou selvagem, como é a designação usual em ciência) é altamente letal em aves, humanos e furões. Sabemos que o H5N1 mutado é altamente letal em furões. Não temos como saber se o vírus mutado é letal em humanos (alguém se voluntaria a testar?). Pode até ser, mas isso iria contra algumas coisas que já aprendemos em virologia até o momento. De fato, passar o vírus sequencialmente em uma espécie que não é o hospedeiro natural DIMINUI a virulência (letalidade) desse vírus ao seu hospedeiro original. Pra dizer a verdade, essa é inclusive uma estratégia que já foi muito usada para desenvolver vacinas virais atenuadas (onde o vírus continua viável, mas não é capaz de causar doença, e de quebra, ainda te dá imunidade contra o vírus selvagem que poderia te deixar terrivelmente doente, com seqüelas ou até te matar). A vacina Sabin, contra poliomelite, é um exemplo. Ela foi passada sequencialmente em cultura de células de rim de macaco (logo, não humano), e isso deu um trabalho ao vírus que precisou se adaptar ao novo ambiente, até o vírus adquirir mutações que permitiam a passagem eficiente em células de macaco. Só que isso teve um preço pro vírus, em troca ele perdeu a patogenicidade (capacidade de causar doença) em humanos. Outras vacinas foram desenvolvidas assim, como contra a febre amarela, sarampo e caxumba (feitas em ovos embrionados). Sendo assim, tendo como base a experiência humana anterior com passagem viral sequencial em hospedeiros animais, a letalidade para humanos desse vírus adaptado a furões deve ser menor que a do vírus selvagem (embora nunca possamos testar isso).

Outra coisa. Eu até concordo que esse vírus deva ser armazenado e manipulado em um local com alto nível de biossegurança, mas não há como justificar que a publicação da sequência genética dele seja um risco. Bioterroristas dificilmente teriam como “montar” um vírus inteirinho a partir de sua sequência genética (seu genoma), isso é extremamente complicado e exige pessoal muito qualificado, equipamentos de ponta e reagentes caríssimos, que dificilmente estariam ao alcance de bioterroristas (muito pesquisador bom gostaria de ter isso ao seu alcance e não tem!). Além disso, há genomas muito mais perigosos que já foram publicados, como o influenza H1N1 que causou a pandemia de 1918 (o nome gripe espanhola é familiar?), o ebola, o vírus da varíola e por aí vai... Se eles quisessem fazer um influenza virulento e transmissível eles poderiam simplesmente fazer passagens seqüenciais em furões. Melhor ainda, eles poderiam simplesmente fazer passagens seqüenciais em humanos (bioterroristas têm bioética?), até surgir um mutante garantidamente letal e altamente transmissível em humanos (afinal, o vírus se adaptou em humanos). E isso seria muito mais simples, fácil e barato que montar um vírus a partir do seu genoma, ou inserir as mutações necessárias para isso (quem já teve que fazer mutagênese sabe o quão complicado isso é).

E mais importante. Pelo post anterior ficou relativamente claro a importância de termos acesso aos deltalhes experimentais e à todos os resultados de qualquer artigo. Só assim, os resultados podem ser replicados por outros grupos, confirmados e aprofundados (geração de drogas, vacinas etc). Essa censura aos resultados engessa a progressão da ciência e atrasa o desenvolvimento de novas armas contra esse vírus. E a natureza, a maior bioterrorista de todas e a melhor geradora de mutantes virais e pandemias não espera.

O corpo editorial da revista Nature e Science, para onde os dois artigos resultantes do estudo foram submetidos, pronunciaram-se repudiando a censura. Porém, os autores relutantemente aceitaram reescrever o artigo, omitindo os dados solicitados pela NSABB (embora eu duvide que eles tivessem tido muita escolha).

A apreensão da comunidade científica se dá por isso. Esse é o primeiro caso de censura à uma publicação científica. Mas quem pode garantir ser o último?


Por Luiza Montenegro Mendonça

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Verdade, ciência e ME/CFS

Uma vez um professor meu de filosofia (cujo nome nem lembro mais) perguntou à minha turma de ensino médio: Onde nasce a verdade?

Depois de muito debater (e não chegar a lugar nenhum, diga-se de passagem), o professor respondeu: A verdade nasce na discussão científica. Grupos de pesquisa experimentam exaustivamente (e repetidamente) até terem certeza de que tal resultado é real. E ali, uma verdade nasce. O HIV é o agente causador da AIDS, é um exemplo. É uma verdade reconhecida. E nasceu através da prática do método científico.


Hoje em dia, a ciência funciona mais ou menos assim. Um grupo de pesquisa tem uma hipótese, imagina os experimentos e controles que precisa fazer pra testar essa hipótese, realiza esses experimentos, analisa e interpreta os resultados e chega à conclusão se sua hipótese é verdadeira ou não (ambos os casos são válidos, e a ciência andaria muito mais rápido se mais artigos com resultados negativos fossem publicados). Ao final, redige-se um artigo científico com a hipótese (e da onde ela surgiu), os métodos experimentais (exaustivamente detalhados), os experimentos, seus resultados e a conclusão. Esse artigo é então enviado a uma revista científica que irá analisá-lo e decidir se ele deve ser publicado como está, se há a necessidade de algum experimento adicional, ou se simplesmente ele não deve ser publicado (por não ter alcançado qualidade científica para tal).


Um artigo científico não termina com sua publicação numa revista (a ciência não acaba aí!). Ele apenas começa ali. A partir desse momento, aqueles resultados serão postos à prova por outros grupos de pesquisa a fim de replicá-los e provar que os resultados são válidos. E é bom que assim seja.


Recentemente, a renomada revista Science publicou a retratação de um artigo original de 2009 que havia primeiramente identificado um novo vírus como o agente causador da encefalomielite miálgica (mais conhecida como síndrome da fatiga crônica, ou ME/CFS, de Myalgic Encephalomyelitis/Chronic Fatigue Syndrome). A ME/CSF é uma doença altamente debilitante caracterizada por dores intensas, náuseas, lapsos de memória e outros sintomas, cujo agente etiológico continua desconhecido e foi por muito tempo praticamente ignorada pelo CDC (Center for Disease Control - Centro de Controle de Doenças dos EUA), que chegou inclusive a considerar que a doença tinha causa psicológica e era relacionada  à abusos e traumas sofridos na infância. Devido a isso, tanto os pacientes de ME/CSF, quanto a pesquisa sobre a doença, nunca foram levados muito a sério.

Então, com o artigo de 2009, pesquisadores isolaram um novo retrovírus de pacientes com ME/CSF, o XMRV (sigla para Xenotropic Murine Leukemia Virus related Virus, traduzindo, se isso fosse possível, ficaria, vírus relacionado ao vírus xenotrópico da leucemia murina) e relacionaram o vírus como possível causador da doença. Finalmente prova de que a ME/CSF era uma doença com causas virais e não simplesmente psicológicas. No congresso anual sobre Retrovírus do Cold Spring Harbor Laboratories (fundado pelo prêmio Nobel James Watson, o mesmo da dupla hélice de DNA) em 2010, duas sessões foram dedicadas apenas para discussão desse novo vírus, tamanha a repercussão dessa descoberta (eu estava lá \o/). No entanto, com o passar do tempo, outros grupos tentaram replicar os resultados originais, sem sucesso. Nesse mesmo congresso alguns grupos já começaram a discutir a fim de tentar entender porque as coisas não funcionavam como deveriam. Cientistas são assim, eles demoram muito e fazem muitos testes antes de afirmar qualquer coisa com veemência. Ainda bem. Por isso na época ainda se discutiam diferenças nos métodos usados por diferentes grupos, possíveis diferenças nas populações de pacientes e por aí vai...


Porém, mais tarde foi-se descobrindo falhas nos métodos e até mesmo omissão de dados relevantes (como o tratamento com uma droga que não estava previamente descrita nos métodos). E a coisa começou a desmoronar. Primeiramente, houve uma retratação parcial de alguns resultados do artigo original, até que finalmente a Science retratou totalmente o artigo com a nota:
A Science perdeu sua confiança no artigo e na validade de suas conclusões. (...) Nós estamos editorialmente retratando o artigo. Nós lamentamos o tempo e recurso que a comunidade científica tem devotado à tentativas infrutíferas de replicar esses resultados.
Esse episódio retrata bem a necessidade de uma comunicação científica transparente e minuciosamente detalhada, a fim de que episódios como esse não se repitam. E para que sempre possamos confiar no peer-review, ou revisão pelos pares, para que a “verdade” possa ser retestada até que se prove ser verdade de fato (ou não). Todo e qualquer interessado deve ter acesso a qualquer detalhe e resultado, a fim de que esse sistema continue funcionando brilhantemente como tem feito até hoje.

Como o virologista Vincent Racaniello costuma dizer: Trust science, not scientists. Ou, confie na ciência, não nos cientistas. A ciência sempre dará um jeito para que a verdade venha à tona, mais cedo ou mais tarde.

E é por isso que um outro episódio vem preocupando a comunidade científica, mas isso ficará pra outro post.




Maiores informações sobre a história da ME/CSF - Chronic Fatigue Syndrome and the CDC: A Long, Tangled Tale.

Ilustração retirada daqui.


Por Luiza Montenegro Mendonça.

O mundo é nerd, só que eu assumo...


Raras foram as minhas notas baixas, nunca repeti de ano, nem nunca fiquei de prova final. Nem na faculdade. Um rótulo que logo associam a mim é: NERD. Quer dizer, nerd dizem hoje, porque antigamente meu rótulo era CDF, que pros menos obsoletos significa C* de Ferro (e eu nunca entendi o porquê, prova de que os nerds não tem as respostas pra todas as coisas). De qualquer maneira, por muito tempo reneguei meu rótulo, mas hoje em dia desisti, tudo bem, sou nerd mesmo... No entanto, ao mesmo tempo, vivo cercada de gente que considero tão ou mais inteligente que eu, e, no entanto, ELAS não se consideram nerds. Todo mundo é nerd, só que a diferença é que eu assumo.

Mas enfim, não estou aqui para falar de mim, e sim para falar de ciência.

Ciência. Essa palavra pra muitas pessoas significa só uma matéria cursada no primário (aliás, isso também mudou de nome). E pra muitas, acabou o primário, acabou o contato com ciência. Mas isso não tem que ser assim! Ciência não está restrita ao primário! Nem aos cientistas! Não é porque você não trabalha com ciência que não possa ter contato com ela, com seus avanços. Para isso foi criado esse blog. A idéia era antiga, mas tomou forma após uma conjunção de fatores: uma disciplina de divulgação científica que cursei, uma fortuita conversa com um grande virologista americano que se preocupa com popularização da ciência, e a vontade antiga de alfabetizar cientificamente o “povo”. Não que ele seja analfabeto por incapacidade, mas sim porque a ciência tem esse velho hábito tentar ser uma coisa elitizada, vide o nome de uma das mais respeitadas comunidades científicas da história, a Royal Society of London (Sociedade Real de Londres). Dona ciência, acorda, os tempos são outros!

Sou cientista (e plebéia).

Nossa. Até eu achei essa frase estranha. Mas é isso, faço ciência, esse é meu trabalho (porque eu considero doutorado trabalho!). Logo, sou cientista mesmo. E acredito ter o dever de contribuir com a divulgação da ciência que se faz no Brasil e no mundo. Minha bolsa de doutorado é paga com dinheiro público. Nada mais justo dar alguma satisfação àqueles que me pagam.

O objetivo então é falar de ciência, de maneira simples. Como minha área é Virologia e Microbiologia, deve haver mais tópicos relacionados a esse assunto. Mas tentarei abordar outras áreas (e talvez até convidar pessoas de outras áreas), para ficar um espaço bem democrático. Não sei se o blog vai dar certo, se haverão leitores, ou se servirá apenas para eu exercitar minha escrita. Mas é como a loteria, há probabilidade de perder ou ganhar, nunca é 100%. A não ser quando não se compra o bilhete!


Por Luiza Montenegro Mendonça
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